sexta-feira, 13 de fevereiro de 2015

A culpa do riso

Porque a realidade é um triste luto faça-se Carnaval. Começam hoje os preparativos para o acontecimento maior da cultura lúdica. Os açorianos gostam de o festejar, e fazem-no, como em tudo, com marcadas diferenças. Profundamente assimétricas, na certeza de que esta diversidade nos enriquece e dá tónus cultural. Que vão da batalha das limas às danças e bailinhos da ilha Terceira, passando pelos afamados bailes da Graciosa. Há em tudo isto uma funda esperança. O Carnaval tem esta suprema função, de interromper a vida, de suster as preocupações, e de, por três dias, a que se somam dois de preparativos, erguer a taça da alegria. O próprio acto de se mascarar revela a necessidade desta interrupção, de se fazer outro, de ter outra cara. Os bailinhos e as danças de pandeiro da Terceira praticam a indispensável sátira social e política. Pondo o dedo nas feridas colectivas, caricaturando tudo. Fazendo com que as pessoas riam da vida, e de todas as coisas, mesmo das mais sérias. Na Terceira, os salões por estes dias são um saudável espaço de comunhão, de matriz inegavelmente democrática. Onde se juntam pessoas de todas as idades para não perder pitada do enredo. No palco actuarão mais de 2.000 pessoas, que se transfiguram, perante os olhos deliciados da plateia, em exímios actores, esforçados puxadores, afinados tocadores de viola, e ágeis bailarinos. Todos comungam deste bem supremo que é o riso. E há até quem chore de tanto rir. Por uns dias alheados dos problemas, das angústias, da dureza que a vida lhes dá e o Carnaval suaviza, no calor dum salão cheio, entre uma dentada numa bifana bem temperada e a gargalhada alada que insiste em fazer doer o maxilar. Saber rir de si mesmo é uma virtude. Disponível aos poucos que nunca se levam demasiado a sério. E que uma boa gargalhada faz mais por nós do que um frasco de calmantes. A euforia destes dias há-de ser capaz de nos dar o que a rotina insiste em roubar.  

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